Aprendi tarde. Mas não foi tarde demais, ó: a cabeça aqui, ainda grudada no pescoço; o coração ainda batendo. Por mais simpáticos que eles sejam, as brotherhoods não incluem as sistas nem no nome. E tem mais, os caras mais simpáticos que conheci, agiam como adoráveis psicopatas. Entre os deles, passam pano para machismo do mesmo jeito que passam no chão de casa. A sujeira continua lá, expondo também quem tentou deixar passar. Circulando ou não nesse meio, reparo que sororidade não é só uma palavra forte e bonita, ou um descanso entre as irmãs. É tipo contra-ataque palestino: questão de sobrevivência.
Perguntei pro meu corpo. Enquanto Sr. Fígado respondia, os rins faziam que sim-sim-sim e o coração ria, meio nervoso. - Um detox emocional vale mais que mil sucos verdes em jejum.
Agoniei de perceber que nadei, nadei, nadei, mas não tinha chegado tão longe daquela criança gorda e chorona, alvo fácil que, além de esperar pelo julgamento dos outros, ainda afirmava (antes mesmo de ter beijado na boca): - Quando for me relacionar com alguém, vai ser aberto. Eu não suportaria um chifre. Sabia nada de relacionamento. Já sabia quase tudo sobre o espinho no orgulho.
Fervendo água pra um litro de chá de boldo aqui, pra digerir. É que, como tudo na vida de uma mulher, amanhã é um dia que tem a ver com homens. Dia de homem, mais cheio de boa intenção que o próprio inferno, vir dar aula pra gente, sobre o que é ser mulher, o que é ser bonita e como é que se luta.
Faz dois meses agora, foi desde essa última virada de ano, que Nelson Cavaquinho não parou de cantar aqui no fundo da cabeça sobre o Juízo Final e sol renascendo. Hoje isso me puxou pra assistir de novo a "O primeiro dia", que tem a ver com virada também, e tem Nelson cantando disso também. Só que é o Sargento, que faz o papel do Vovô. O filme parece ter pegado uma fórmula de mexer fundo comigo e botado na tela. Fico sem palavras, aí acaba sobrando adjetivo: humano, real, sensível, lindo. Só pelo roteiro eu já me sentiria completamente na pele de Rosa ou de Maria. Já vivi também minhas histórias arriscadas com um João, Francisco ou Pedro. Como se não bastasse a força do roteiro, os diretores ainda quiseram overdose de poesia com a fotografia e uma trilha feita por gênios. Geniais também as atuações, no tanto que elas acrescentaram, arrepiaram. Sofrer parece definitivamente grande perto de não viver, ou não saber. E o que vem logo depois, é ainda maior. A chance de ver as coisas virarem...que chance! Até lá, é muito encontro, muita fuga mal explicada, muito esbarrão, desespero de morrer e de matar, de renascer. Direção de Daniela Thomas e Walter Salles, que também assinam o roteiro, com José Carvalho e João Emanuel Carneiro. Fotografia de Walter Carvalho e trilha de BID, Naná Vasconcelos e Antônio Pinto Entre as atrizes e atores, Fernanda Torres, Luiz Carlos Vasconcelos, Matheus Nachtergaele, o Nelson Sargento, Tonico Pereira, Carlos Vereza e Luciana Bezerra.
Vou por um caminho que lembra cebola dourando: tem espera, algum medo de queimar, um cheiro gostoso (e tantas vezes ele me entusiasmou!), "barulhinho bom" e vontade de temperar.
Aqui lanço os pedacinhos, "produto que é interno e bruto", dos devaneios de trajeto.